sexta-feira, 27 de agosto de 2010

21. O Cortês


Era um trabalho simples e limpo, o cliente me liga, marca um ponto, nos encontramos, eu vendo e vou embora. Sem armas, sem favela, tudo baseado na cordialidade entre vendedor e comprador.
            O chefe dizia que havia uma lista seleta de fregueses e que eu não deveria incluir mais nenhum nas vendas. Eu bem que tentei por um tempo, mas algumas pessoas não sabem o que “não” significa
            —Por favor, eu preciso de um fornecedor que seja confiável. — Ele me dizia todas as terças enquanto eu aguardava meu cliente no parque.
            —E eu com isso?
            —Dizem que você é um vendedor que eu posso confiar.
            —Não sou vendedor de nada, você deve ter me confundido com outra pessoa.
            —Por que você insiste nesse seu joguinho? Deixe-me ser seu comprador e eu te deixo em paz. — Devo admitir que eu me divertia muito com o sofrimento misturado com irritação e desespero dele.
            —Você não conhece meu chefe. — Eu dizia por fim antes de avistar meu cliente, correr até ele e colocar a mercadoria em seu bolso ao mesmo tempo em que pego o dinheiro. Era tudo extremamente discreto. Esse cliente comentou uma vez que eu tinha mãos tão leves que eu poderia seguir carreira como batedor de carteiras. Talvez eu ainda siga.
            Depois de alguns dias, falei com o chefe sobre o chato do parque.
            —Nem pensar! — Ele disse categoricamente. — Não sabemos a precedência desse sujeito, ele pode comprometer todo o empreendimento. Quem falou de você pra ele afinal?
            —Não tenho idéia, ele não disse.
            —Nem pensar! — Ele repetiu. — Os clientes devem passar pela minha aprovação antes de chegar a qualquer vendedor meu.
            Mas a minha conversa com o chefe não fez o chato desistir. Ele continuou indo ao parque todas as semanas. Um mês e meio se passou antes de eu finalmente explodir.
            —Chega! Porra! Não é possível que você precise tanto de erva! Toma essa merda! — Abri minha mochila e joguei dois pacotinhos na cara dele. — Agora some da minha frente!
            Mas ele não sumiu. Ao contrário, ficou parado e sorriu.
            —Não se mova — Ele disse e puxou uma arma do cós das calças. — Você está preso.

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