Entro em casa e lá está ela. Sentada na poltrona como um Dom Corleone com peitos e sem bigode numa sala iluminada apenas por um abajur.
—Onde está seu charuto, Dom Vito? — Eu brinco. Ela continua séria, imponente.
—Quem é ela? — Ela diz numa voz mórbida.
Olho em volta procurando uma terceira pessoa, mas não há ninguém além de nós dois. O silêncio machuca meus ouvidos.
—Ela quem? — Eu pergunto quebrando o silêncio.
—A vadia! A outra! A sua Ana Bolena! — Ela grita se levantando.
—Puta que pariu! — Eu digo — Eu não acredito que você acha isso. O que te faz pensar que eu tenho um caso?
—Você me trouxe flores ontem, bombons anteontem e sapatos semana passada. A Marie Claire diz que presentes demais é sinal de affair.
—Eu não posso simplesmente querer agradar minha esposa?
—Você só começou a fazer isso mês passado em cinco anos de casados! — Ela levanta ainda mais a voz.
—Você vai acordar as crianças gritando assim.
—Desculpa. — Ela diz e respira fundo. — Mas me diz, por que tanto presente? Está se sentindo culpado?
—Não! Eu ganhei aquela promoção mês passado e achei que seria legal te fazer uns agrados, a gente nunca teve grana sobrando pra caprichos nossos. Não acredito que você desconfiou de mim desse jeito. — Agora quem está puto sou eu.
Ela pondera por alguns segundos.
—E aquela mensagem no seu celular de alguma mulher pedindo pra buscá-la na rodoviária?
—Minha irmã? Ela veio de ônibus pro Rio e não queria pegar táxi até o hotel.
Ela fica estática. Seus olhos se enchem de lágrimas.
—Desculpa, meu amor! — Ela diz já chorando.
—Ta, eu vou dar uma volta de carro pra dar uma arejada.
Saio sem dizer mais nada. Ao entrar no elevador, saco meu celular e disco o número de sempre.
—Oi, briguei com ela, me encontra naquele botequim de sempre no Leblon. Preciso conversar.