terça-feira, 26 de janeiro de 2010

4. Jazz e Vinho Tinto


—Eu te amo. — Ela me diz olhando nos meus olhos.
            —Eu também, meu amor. — Eu respondo sorrindo.
            A sala, iluminada apenas por algumas velas, está impregnada pelo jazz que sai da velha vitrola. Encho nossos copos com um pouco mais de vinho.
            —Sério? Às vezes não parece. — Ela me diz com um olhar suplicante.
            Deve ser a milésima vez que ela me diz isso em tão pouco tempo do nosso relacionamento estranho. Ela não imagina o quanto eu já sofri por demonstrar todo meu amor a alguém. Respiro fundo e sinto vontade de chorar.
            — Eu sei, mas é difícil pra eu repetir algo que já me machucou tanto. Tanta dor acabou criando um tipo de prisão dos meus sentimentos. Mas eu tento, eu tento mesmo demonstrar. — Eu respondo depois de algum tempo.
            Ela se levanta e acende mais uma vela. Penso em como ela fica linda só de calcinha e com a minha camisa. As sombras bruxuleantes da sala fazem eu me sentir num filme antigo. Se ela pudesse ao menos enxergar dentro de mim, o que ela pensaria?
            —Se você ama mesmo, me descreve o amor. — Ela me diz se sentando de novo ao meu lado no chão.
***
Ele pensa. Demora demais para responder. Os segundos viram minutos na minha cabeça. Continuo encarando os olhos verdes dele e admirando seu tronco nu entre as luzes e sombras dançando. Penso em como ele fica lindo com essa calça jeans.
            —Não sei se dá pra descrever o amor. Mas o que eu sinto é a vontade de ficar perto de você a cada segundo. Sinto calafrios em te imaginar longe, meu coração quase para quando eu imagino que posso te perder. Eu consigo me ver daqui vários anos com você. Me vejo casando com você, tendo filhos com você, envelhecendo com você até o fim dos meus dias e eu nunca consegui visualizar isso com outra pessoa. — Ele responde antes de sorver um belo gole do vinho.
            Bebo um pouco de vinho e fico pasma. Talvez o filho-da-puta realmente me ame.
—Eu te odeio. — Eu digo quase chorando. Ele franze o cenho sem entender nada. — Cara, só você é assim. Quando eu acho que não temos mais salvação você arruma um jeito de fazer tudo ficar bem. E tudo acontece de um jeito tão inocente que me derrete quando eu deveria ficar mais do que puta com você.
            —Esse é tipo de coisa que te deixa molhadinha? — Ele pergunta sorrindo. Eu sorrio junto mordendo o lábio.
            —Promete que nunca vai me deixar?
***
—Prometo. — Eu respondo de prontidão. Nunca fiz uma promessa tão honesta antes.
            Os olhos dela se enchem de lágrimas e ela se joga em mim, me abraçando com força.
***
            Ele me abraça de volta e eu sei que tudo, tudo vai ficar bem.
            Nós nos beijamos.

Problemas

O Blogger anda com sérios problemas pra aceitar minhas postagens e quando aceita ele não carrega as páginas e isso vem me irritando, então em breve vou trocar de servidor. Peço desculpas pelo transtorno.

quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

3. Cidade dos Condenados

Desculpa a demora, pessoal, eu fiquei travado longe do pc depois de uma cirurgia tripla do nariz. Qualquer dia eu escrevo sobre ela. Aí embaixo tem meu primeiro poema sério, ele foi escrito numa aula de Literatura na Inglaterra, em inglês obviamente, mas eu traduzi tomando cuidado pra (tentar) manter as rimas... Divirtam-se, terça que vem tem mais.

Traficantes e putas viciadas
Andando na noite morta
O pobre sai em eterna cilada
Enquanto o rico fecha sua porta

As sombras cobertas por cores
O chão coberto de esterco
Pessoas em volta cheirando não só flores
Em becos onde até hoje me perco

Garotas seminuas provocando os garotos
Garotos vestidos dispostos a pagar
Eles brincando com elas com risos escrotos
Elas vendo neles um jeito de se abastar

Uma geração com imaginação
Perdida em bares e concreto
Todos afogados em fascinação
Dançando em um erótico dueto

P.S.: Pros menos imaginativos, o poema trata da famigerada Rua Augusta

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

2. 1977


Só se passaram nove anos desde a Revolução Sexual e aquela garota está na minha frente abrindo as pernas e mostrando sua calcinha sem pudor algum no meio da boate lotada.
            O punk me olha e eu sorrio enquanto ele amarra o torniquete no braço direito e puxa com força com os dentes. O Madame Satã está lotado, principalmente no porão onde estamos.
            —Esses caras são muito bons! — A garota grita sobre a banda que está no palco tocando músicas dos Sex Pistols.
            —Com certeza! — Eu grito de volta e ela sorri sem perceber (ou sem se importar) a ironia
            Mas eu não estou aqui por causa da banda ou por causa da garota, estou aqui por causa do líquido dourado na seringa do punk.
            —Minha vez. — Eu digo sem cerimônia quando o conteúdo chega na metade.
            Arregaço minha manga e improviso um torniquete com o meu cinto, dou tapas no braço com força para encontrar a veia. Quando ela salta eu sorrio e, com a mão direita, pego a seringa e encosto a agulha na veia que está quase pulando para fora do meu braço esquerdo.
            Fecho os olhos e sinto a ponta da agulha perfurando minha pele. Empurro o êmbolo lentamente e sinto minhas veias serem preenchidas pela maior sensação de prazer que já senti na vida e que jamais vou sentir de novo.
            —Melhor do que sexo? — A garota me pergunta enquanto eu afundo no chão deslizando pela parede na qual estou encostado.
            —Provavelmente é melhor do sexo com você. — Eu respondo revirando os olhos, tentando calar a boca dela.
            Passam-se alguns segundos ou horas, não sei mais, e ouço um tiro, a música para e as luzes se acendem.
            —Todo mundo no chão, bando de maconheiro filho da puta!
            Aturdido, perco a consciência, não sei por quanto tempo e sou acordado por dois homens me puxando com força do chão pelos braços.
            Minha cabeça gira, a sensação de prazer ainda está em mim e eu começo a rir quando sinto algo subindo. Vomito no chão enquanto sou carregado para fora onde ouço as sirenes dos carros da PM. Fodeu, eu penso.
            Mas um dos policiais do lado de fora me reconhece e grita meu nome correndo em minha direção.
            —Deixem que eu me encarrego desse. — Ele diz para os brutamontes que me soltam. Eu caio a poucos centímetros dos restos de comida que deixei no chão, de cara com o concreto da calçada fria.
            O PM que me conhece pega meu braço e põe em volta do pescoço dele me carregando até seu carro e me levando para casa.
No caminho ele me diz coisas que eu não consigo entender, minha cabeça ainda gira e eu ponho a cabeça pra fora da janela sentindo o vento no rosto. Ele me puxa de volta e continua falando, cada vez mais exaltado, batendo no volante a cada palavra.
Não entendo o que ele diz, tudo que penso é que ser da polícia militar me dá boas vantagens.

terça-feira, 5 de janeiro de 2010

1. Golpe de Sorte


O banheiro está vazio, como de costume, entro e mijo imaginando se os pedreiros fedidos que reformam o lado de fora do banheiro são homossexuais espiando os homens daquele sanitário pela janela estreita de vidro. Verifico se a braguilha está mesmo fechada e lavo as mãos. Ouço passos entrando e são delicados demais para serem de um homem.
Ela para na minha frente vestindo meu casaco e me fita mordendo os lábios como quem diz: vamos transar ou não vamos? Puxo-a com força para perto de mim e a beijo como nunca havia beijado uma mulher, as quatro mãos percorrem os quatro cantos dos dois corpos separados apenas pelo tecido que nos veste.
—Vamos dar algo pra esses pedreiros espiarem. — Eu digo enfim, deixando uma interrogação na face macia dela.
Meia hora depois nós saímos despenteados, suados e com sorrisos em nossas bocas vermelhas e lambuzadas. Uma camisinha a menos na carteira, penso enquanto sinto minhas costas arderem com os arranhões ferozes daquela garota ao meu lado.
Ela abre a sua bolsa e tira um maço de Lucky Strike, acende dois e me dá um, que aceito de muito bom grado. Isso sim é um lucky strike, não cigarro, mas o fato de ter aquela menina-mulher ao meu lado, segurando a minha mão, o verdadeiro golpe de sorte.
Em algum ponto do trajeto, ela para, me olha de frente e pergunta:
—Você me ama?
É uma pergunta hostil da parte dela, fico sem reação e, no desespero, digo a verdade:
—Não sei.
Eu amo transar com ela, amo passar minhas tardes com ela, amo ficar chapado com ela. Mas isso não é amar ela, é?
Percebo que dei a resposta errada quando ela começa a andar na direção em que estava parada, oposta a minha. Fico parado sozinho na metade do caminho para lugar nenhum sem camisinha, sem cigarros, sem ninguém. Sem a porra de um golpe de sorte.

Motivos, causas e consequências.

Tá, eu queria publicar um livro com os meus textos, mas quem consegue publicar um livro de contos no Brasil? Acertou quem disse ninguém. Mas eu quero mais do que ser publicado. Eu quero ser lido e, quem sabe, reconhecido. Por isso eu criei esse blog, pra ser lido. Vou colocar aqui coisa nova uma vez por semana. Contos, poesias, ensaios e o que mais me vier a cabeça. Mas também não vou largar meu outro blog, o Blog da Discórdia, quero harmonizar os dois.


Senhoras e senhores, nossa viagem começa agora.