segunda-feira, 19 de abril de 2010

15. Valores


Ela fica dizendo bobagens sobre meu trabalho, falando sobre a profundidade das minhas músicas, citando trechos, cantando melodias e acordes.
            —Você é um poeta, me inspirou a escrever minhas próprias músicas. — Ela diz entre um gole e outro de gim com tônica.
            Não acredito que estou pagando mais de 200 reais nesse bar só pra a ouvir falar impropérios sobre mim.
            —Obrigado, mas eu não sou um poeta, só um cara que gosta de entreter as pessoas com a minha arte, com os meus sentimentos. — Eu respondo olhando pro vazio, deixando claro o meu desinteresse.
            Ela ignora a falta de atenção e coloca a mão na minha coxa.
            Bosta, penso.
            —Não se subestime. Você é um poeta. Quer um pouco de pó? — Ela diz a última frase com tanta naturalidade que eu, por um segundo, penso que se trata de pó-de-arroz.
            Malditas sejam as tietes. Eu realmente achei que essa fosse diferente quando a chamei pra sair ontem depois do show. Eu realmente me dispus a gastar uma grana com ela ao invés de simplesmente leva-la pra cama por pensar que poderia ser algo sério. Doce ilusão.
            —Não, obrigado. Eu parei.
            —É, eu vi na entrevista da Rolling Stone, mas achei que você só estava bancando o bom moço.
            A mão dela sobe pela minha perna e encontra a origem dos meus futuros filhos. Ela o massageia por baixo do balcão e eu não consigo esconder meu tesão.
            —A gente faz o seguinte; — Ela começa. — vamos ao banheiro e usamos os sentidos, eu cheiro e você me toca, o que acha? — Ela diz isso como um último suspiro de uma groupie desesperada.
            —Parece ótimo. — Eu minto. — Vai na frente que eu te sigo em dois minutos.
            Ela sorri e sai com pressa. Deixo o dinheiro no balcão, chamo o barman e digo:
            —Olha, tem uma moça no banheiro, quando ela voltar, dá esses 50 reais pra ela pegar um táxi.
            Saio do bar e dou de cara com uma puta numa esquina.
            —Ta afim de diversão? — Ela pergunta seguindo o roteiro.
            —Quando é?
            —100 reais.
            —É... Bem mais barato.
            Abro a porta do carro e a deixo entrar.

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