terça-feira, 13 de abril de 2010

14. O Cumprimento do Adeus


Eu me levanto jogando a bituca fora e vou embora a deixando lá parada, sei que ela está me olhando, sinto o olhar na minha nuca, mas não olho para trás. Jamie Cullum começa a cantar na minha cabeça por algum motivo obscuro e ouço de longe o meu nome.
            Não resisto e olho para trás, ela corre em minha direção e finalmente me abraça com um beijo. Quando finalmente nos soltamos eu olho em volta e ele está lá, do outro lado da rua, me fuzilando com o olhar.
Meu rival e amigo também corre em minha direção, mas não creio que os motivos sejam tão nobres quanto os da garota que acabo de beijar. Um soco e eu caio no chão atordoado. A luz do sol perfura meu olho, mas consigo ver o bico do pé dele voando para as minhas costelas. Um, dois, três, quatro, cinco chutes. Dói pra caralho.
Consigo me levantar e sou recebido de volta com uma cotovelada na têmpora, o filho-da-puta é incrivelmente maior que eu, na confusão eu não consigo ver para onde ela foi.
Sinto o sangue quente na minha boca, mas reúno forças pra contra-atacar e enfio um gancho de direita no queixo do infeliz que cambaleia para trás e corre para me dar uma cabeçada, me desvio no último segundo e coloco meu pé na frente que o faz cair de cabeça no chão áspero da calçada.
—Não quero brigar! — Eu grito esvaziando meus pulmões.
—Então não deveria ter provocado! É tudo culpa sua, seu manipulador de merda! — Ele respondeu se levantando. Achei uma ofensa injusta, não manipulo merda, manipulo sentimentos... Mas qual é a diferença?
Ele me dá um último soco no estômago que faz eu me dobrar e sai correndo, eu acho que ele está chorando, não tenho evidências, mas o conheço bem demais. Quando recupero o ar, cuspo o sangue que ficou na minha boca e a lavo com um gole do whisky que estava na minha mochila.
Acendo um cigarro enquanto o observo correndo como o vento. Não sei porque, mas um sorriso brota no canto da minha boca, mas não dura muito.
—CUIDADO! — Eu berro, mas ele não me ouve, ou não quer me ouvir e continua correndo no mesmo ritmo.
Ele está a três passos do outro lado da rua quando um Grand Caravan em alta velocidade o acerta. Meu cigarro cai no chão com a garrafa de whisky que se quebra em mil pedaços.
Uma lágrima escorre pelo meu rosto enquanto observo, impotente, o corpo inanimado voando a vários metros do chão. O motorista freia o carro que tem seus pneus rasgados. O airbag é acionado e uma nuvem de fumaça fétida se levanta em volta da cena. O motorista se dirige ao corpo no chão e começa a chorar, desolado, ajoelhado no chão.
O motorista é o pai dele.

Um comentário:

Dominique . disse...

impressionante como eu consegui imaginar exatamente como a cena de um filme (: